PREFÁCIO

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Esse livro me pede uma franqueza que ninguém deve ter. Então, caros olhos que me acompanham, se você se sentir confuso e, talvez, encontrar semelhanças pessoais com os personagens, não entre em pânico, não é uma coincidência fatal. É só que a loucura é a realidade em outro formato e até mesmo as geometrias pessoais se encaixam.


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11.10.08

Capítulo 3


“Judith?”, disse uma voz tosca e seca vinda dos fundos do Hall. Um tapete vermelho com símbolos maias cobria todo o chão, no fim do corredor de paredes nuas, havia uma porta antiga de fechadura torta entreaberta. De lá, surgia uma voz calma, despreocupada e sem esforço, “Sim... Marco...”.


Ele empurrou a porta e ali estava uma mulher de meia idade, com os cabelos loiros presos por uma fita de cetim azul, sentada defronte uma escrivaninha rústica.
- Afinal, o que tanto faz enfurnada nesse quarto?
Olhando de esguelha para Marco, ela tentava se lembrar do espírito jovem do marido de quando se casaram e pensava como era incrível a idade ser capaz de envelhecer a alma.


Respondeu então ao homem de olhos castanhos e cabelos grisalhos “Estou arrumando meus papéis...”.


- Não sei porque perde tempo mexendo com isso. – mirando com ar de desprezo as pilhas pequenas de papéis coloridos.
- Você sabe que é importante para a Belinda... – como que a ignorar cada palavra dele.
- Ah! Você e essa sua filha louca!
- Ela também é sua!


- Não, minha é que não é! Se ela continuar a falar essas histórias malucas que você coloca na cabeça dela, eu vou...
- Você vai fazer o quê? – levantou-se da cadeira num salto e o encarava.
- Vou ser obrigado a pedir medicações mais fortes para você, você está surtando!
- Se nem eu sei da minha loucura, quem é você para medir minha falta de sanidade?
Um grito cortado por um estampido ecoou pela sala, um corpo tombava no chão. O homem saiu do quarto atrás de um de seus funcionários. Parece que logo se entende porque todos os cômodos possuem tapetes vermelhos.
O cetim azul se tornou negro.Uma menininha entra no quarto:


- MÃE!
...


Como eu sei dessas coisas? Dizem que é mais fácil quando se acredita em Deus. Mas sou ateu, não levo a sério essa divindade popular. Se existe um Deus, ele com certeza está no olhar das pessoas e foi isso que eu aprendi com essa menina.
...
- Parece que só eu vim hoje...
- Ah, Bel... Mas todas as noites são só você.


- É, né... Seu bobo...


- Mas como foi com a Judith?


- Nós voamos... – sorria furtivamente olhando o chão.
- Para onde?


- Até onde os pés alcançam.
- Pensei que voar fosse bailar no céu...
- E é... Mas a graça de voar está na certeza com que toco o chão.
Fiz aquela cara de dúvida parada no espaço e ela retribuiu com uma risada gostosa.
-Ah, Fim, o chão pode ser céu, depende só da retina da sua imaginação...
- Então, vamos amar no céu hoje?
- Amar como?
- Do maior jeito que couber no mundo.
- No meu ou no seu mundo?
- No nosso.
- E como é o nosso?
- Tem um abismo apertado – chegando perto dela – onde cabe meu corpo enrolado no seu...
Ela sorriu. E, de repente, pareceu que o amor brotava entre os nossos dedos com o toque.

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